Elogio às Cigarras

Professora, pintora, autarca do BE na Câmara Municipal de Torres Novas

“A formiga avisava-a que não ia haver comida em breve.

A cigarra continuava a cantar”

“A formiga avisava-a que não ia haver comida em breve.

A cigarra continuava a cantar”

1 de janeiro de 2021 e o País acorda com a notícia da morte de Carlos do Carmo, a voz que renovou o fado. Carlos do Carmo foi mais um extraordinário intérprete da muito nossa musicalidade e, compreendemos o quanto nos enriqueceu com o seu canto. Termos sido contemporâneos desta figura é de enorme privilégio e, o legado que nos ofereceu, vai mais além do grão de poeira cósmica que habitamos.

A propósito da relevância do cantor na nossa história comum e, contra a moral da fábula da formiga sempre enaltecida, relembro os e as artistas, que ficaram sem palco nem público, nas festividades de Natal e Ano Novo. Quem tem como desígnio desta vida vir para nos (en)cantar tem, certamente, o melhor destino do mundo mas, em tempo de restrições, entendemos que seja profundamente perturbador, para a sustentabilidade dos e das artistas e suas famílias, o não agendamento de espectáculos. É por isso que não compreendo muito bem a relevância das políticas públicas para este setor. A nível local, criaram-se algumas animações de rua antes do Natal, junto ao comércio local e na Feira dos Produtos da Terra, com Anymamundy, Sons da Suévia, Malatitsch e Bombones e David Antunes por ocasião do Ano Novo. Não sei onde atuaram os artistas locais. Destes não reza a história. Também não sei como conseguem sobreviver com o alheamento da política cultural de “proximidade” praticada por “estas bandas”. Mas sei que perdemos a oportunidade da época de, por exemplo, encher as ruas da cidade e das freguesias, com carrinhas e atrelados a levar música e os artistas (com segurança), à população confinada. Ora aqui está mais uma ideia que poderia ser “apropriada” pelos executivos, até porque também fui buscar a inspiração a concelhos vizinhos. Até lá, continuamos a léguas do significado da palavra Cultura local de proximidade, e esta de reforçar o eixo de Torres Novas comoCidade cultural” e outros chavões “com o objetivo maior de se manter um MUNICIPIO COMPETITIVO, PRÓXIMO E PARTICIPATIVO” do pregão.

Às cigarras restará sempre o triste fado.

Artigo publicado no jornal "O Almonda"