Memórias:
Tinha os meus sete anos no dia vinte cinco de Abril de 1974.
Aqui nesta aldeia onde ainda hoje sou residente, era manhã e brincava no terraço da casa dos meus pais, como um qualquer outro dia.
Ouvi de longe uns grandes estrondos e senti medo.
Sei que corri porta dentro e perguntei à minha mãe se era a guerra?
Só me recordo desta palavra, dita pela minha Mãe: LIBERDADE!
(hoje penso que esta situação aconteceu no dia 26 de Abril, ouvia-se o eco dos canhões em Tancos, quando os militares faziam VIVAS pelo novo amanhecer!
Logo chegou o 1.º de Maio.
Nesse dia depois de almoço, fomos ao café do "Ti Artur", o meu pai vestia um "fato completo" e na lapela do casaco tinha um cravo vermelho.
No café do "Ti Artur" juntaram-se várias famílias da aldeia, o ambiente era festivo com abraços e beijos.
Todos os homens que lá se encontravam tinham um cravo vermelho na lapela dos seus casacos, as mulheres também os levavam nas mãos e iam distribuindo a quem não os tinha, estranhei esse dia, pois ainda não tinha visto nenhum parecido ou igual.
Sei que foi um dia feliz da minha infância sem sequer perceber o que tinha acontecido.
Depois nesses tempos seguintes, todos os dias durante muito tempo ouvia na velha rádio as canções da Liberdade, ainda não tínhamos TV em casa.
Anos mais tarde:
Com os meus 10 ou 11 anos, subi ao sótão da casa dos meus pais, encontrei lá uma mala de viagem cheia de pó;
Curiosa, abri a mala e encontrei umas revistas que desfolhei, tinham o nome de "Gaiola Aberta".
25 de Abril de 1974 a "Gaiola" abriu-se… e o direito à palavra correu todas as ruas do meu País.
São as poucas memórias que tenho, mas ainda estão vivas.
Liberdade
Sérgio Godinho
Viemos com o peso do passado e da semente
Esperar tantos anos torna tudo mais urgente
e a sede de uma espera só se estanca na torrente
e a sede de uma espera só se estanca na torrente
Vivemos tantos anos a falar pela calada
Só se pode querer tudo quando não se teve nada
Só quer a vida cheia quem teve a vida parada
Só quer a vida cheia quem teve a vida parada
Só há liberdade a sério quando houver
A paz, o pão
habitação
saúde, educação
Só há liberdade a sério quando houver
Liberdade de mudar e decidir
quando pertencer ao povo o que o povo produzir
quando pertencer ao povo o que o povo produzir
25 de ABRIL, SEMPRE!
22/04/2020
Célia Santos