O céu melancólico, a distância e a voz abafada pelas máscaras, pouco convidavam para a Festa da Liberdade, mas as cerimónias oficiais do município de Torres Novas, sobre o 25 de ABRIL, transportam-nos a uma experiência de frustração enfadonha e escassa, contrária a alguma ação mais eloquente sobre a alegria anunciada pelo fim da ditadura.
Ah a liberdade e tal! A defesa da democracia e os direitos humanos, claro!
De palavra largada, diminuída à frágil emoção que a proclama, o cenário resume-se aos discursos dos diferentes partidos com assento em Assembleia Municipal, cabendo ao PS três momentos em overdose de representação. Está previsto. Mai nada! Democracia oblige.
E toca de cumprir serviço, sem o alento do genuíno e franco que nos merecem os/as bravos/as, as Catarinas, os Salgueiros, os capitães, os/as anti-fascistas perseguidos/as, os/as presos/as, torturados/as, os/as artistas, os poetas e as poetizas, os/as cantores/as, ah! O Zeca e os/as que levaram - e ainda levam - a coragem à festa maior.
É a democracia a desgastar-se neste cenário composto, onde só o Hino Nacional obriga a erguer o corpo sentado, vestido na seriedade formal das coisas muito importantes adiando o acordai que apertado, ata o nó de gravata vermelha colocada para a ocasião.
Com mais ou menos pandemia, ou mais ou menos chuva, festejar a democracia e a liberdade não é apenas importante pela homenagem aos que a conquistaram, é fazer a nossa parte, bem mais simples e grata, permitindo o garante deste património ao presente e ao futuro. Que melhor tributo se poderia almejar?
Mas foi mais um ano com a Grândola Vila Morena silenciada, não fora a ousadia insubmissa a lembrar um Espanhol cuja voz livre também o tempo emudeceu. Levamos assim décadas de simulação, anos de bailado e natação, num exercício envergonhado, pachorrento, sem gestos audazes ou laivos de alegria viva!
É assim tão complicado VER a contaminação do avesso das coisas que supostamente celebramos? Inquietação. É a liberdade caramba!
Crónica publicada no jornal "O Almonda"