A água tem dono?

Autarca. Coordenadora Concelhia do Bloco de Esquerda de Torres Novas.

O debate sobre a propriedade da nascente do rio Almonda e das suas águas está lançado.

O debate sobre a propriedade da nascente do rio Almonda e das suas águas está lançado.

Ainda bem, porque não há nada como trilhar o caminho para o esclarecimento, as dúvidas não ajudam à razão.

Há milhares de anos que aquelas pedras do arrife assistem ao desabrochar daquelas águas vindas da barriga da serra.

Nos anos 40 do século passado alguém “inventou” um negócio, vender/comprar o espaço onde se encontra a nascente que era baldio. Como foi possível alguém vender o que não lhe pertence? Os baldios são por definição propriedade do povo.

A Renova ficou proprietária de um território porque o fascismo tinha as suas regras, tinha os seus interesses, só meia dúzia de cidadãos sabiam ler e escrever, o povo não tinha acesso à educação e os negócios faziam-se “porque em terra de cegos quem tem olho é rei”.

A Renova retira da nascente qualquer coisa como 280 m3 de água por hora, mas retira porque lhe foi passada uma licença de captação, ou seja retira a água porque a APA (Agência Portuguesa do Ambiente) a autoriza a retirar e ainda bem pois assim alimenta uma fábrica importante para esta região.

A intenção de alguns é retirar o acesso do povo à nascente natural do nosso rio Almonda, mas a coisa não está fácil, pois ninguém entrega o ouro sem primeiro dar luta.

O BE fez perguntas ao governo, o que incomodou muito boa gente, desde logo o poder local que deveria ter uma posição inequívoca de defesa do acesso público à nascente e devia inclusive arranjar o caminho de acesso, é para isso que são representantes do povo.

Também muitos populares, vizinhos da nascente e diga-se, muitos visitantes dos mais variados cantos teimam em fazer companhia às aguas que saem das entranhas da serra. Mais, os espaços em volta não são todos da Renova, existem uns tantos “gauleses” que teimam em resistir, honrando a memória dos seus antepassados que ali viveram e construíram a vida a pulso (ainda lá estão os vestígios bem visíveis do que foi aquele lugar, Moinho da Fonte).

Mas certamente todos se interrogarão, não podia aquele lugar ser pacificado? Um lugar em que todos os interesses coexistiam? A Renova retirava a água para o seu negócio e o povo retirava o prazer bucólico daquele lugar ímpar? Poder podia, ….. mas não era a mesma coisa.

É certo que os poderosos têm poder, arranjam amigos com facilidade, conhecem muitos corredores, é verdade, … mas não é menos verdade que quem resiste sempre alcança.

Opinião de António Gomes publicada no Jornal "O Almonda"