Há dias atrás, no âmbito da pré-campanha eleitoral, visitei o lugar onde passei a maior parte da minha vida (47 anos), as oficinas da CP no Entroncamento.
Não que tivesse saudades, mas o espaço, o cheiro e acima de tudo a oportunidade de rever alguns companheiros que ainda por lá se encontram, que ainda lá continuam a vender a sua força de trabalho, foi uma boa recompensa. Há gente nova, felizmente. O número de trabalhadores é diminuto face aquilo que foi em tempos, a exigência de mão de obra na manutenção e reparação dos comboios é menor, a fiabilidade e durabilidade dos materiais e das tecnologias utilizadas são hoje incomparavelmente maiores.
A peso da despesa com recursos humanos afetos à manutenção e reparação dos comboios nas contas da empresa é hoje consideravelmente menor, desde logo pelo menor número de trabalhadores, mas também pelos baixos salários praticados. O início de carreira está pouco acima do salário mínimo nacional e o salário médio tem baixado consideravelmente, o que leva à saída de trabalhadores especializados para outras paragens como é o caso, por exemplo, do METRO em Lisboa.
Outros casos vieram à conversa, como a greve realizada em 7 de dezembro de 1973, a primeira em que participei no mundo do trabalho, tinha tido outra experiencia na escola enquanto estudante. A greve de 7 de dezembro visou a injustiça nos salários, a miséria dos salários a que o fascismo submetia os trabalhadores. O salário que auferia na altura era de 2500 escudos, se traduzidos para euros daria a módica quantia de 12.5 euros.
O tempo da Troika foi outro que passámos em revista, foram anos e anos sem aumento de salários, foram anos de corte nas férias e no subsídio, no 13ºmês, foram os cortes nas horas extraordinárias e no subsídio de doença, foram os cortes nos feriados, foi o imposto adicional no IRS, foi a escandalosa subida dos impostos como o IVA em vários produtos, foi a privatização da CP Carga e a quase privatização da EMEF, ficaram a faltar algumas semanas ao Governo de Passos Coelho/Luis Montenegro para a coisa se concretizar e foi o fim dos passes dos ferroviários que permitia a estes viajar gratuitamente nos comboios onde ou trabalharam toda a vida ou ainda lá trabalhavam, até este direito com mais de 100 anos tiveram o desplante de acabar.
Hoje, este direito foi reposto graças à tenaz luta que ferroviários e familiares desenvolveram, (muitas greves e muitos cortes de linha) mas também fruto da conjuntura política que se seguiu (o que ficou conhecido como “geringonça”).
Às vezes querem que acreditemos que foi tudo culpa da troika. Não, não esqueçamos que o objetivo era mostrar “que podemos ir além da troika”. E, já agora, o que é que a troika teve a ver com a retirada dos passes aos ferroviários? Não teve a ver com dinheiro, teve a ver com vingança, vingança em relação aos direitos e conquistas dos trabalhadores, havia que reduzir direitos.
Os comboios são o futuro, todos o dizem, mas alguns só caminharão nesse sentido se a isso forem obrigados, os salários dignos têm de fazer parte desse futuro e os contratos assinados por Pedro Nuno Santos na ferrovia não contemplaram os salários dignos. Esperamos mais do futuro!