PRESTAÇÃO DE CONTAS E RELATÓRIO DE GESTÃO DO EXERCÍCIO / 2019

Conheça a declaração de voto da vereadora Helena Pinto - depois de uma análise detalhada, conclui:

"Este era um orçamento que permitia avançar e o PS perdeu essa oportunidade."

"O BE não acompanha a narrativa que sustenta este Relatório. As contas podem estar certas, mas a narrativa sobre o que se fez não corresponde à nossa avaliação. O nosso voto é contra."

PRESTAÇÃO DE CONTAS E RELATÓRIO DE GESTÃO DO EXERCÍCIO / 2019

A primeira ideia que ocorre depois de ler o Relatório da Prestação de Contas de 2019, o relatório da Revisora Oficial de Contas e a Introdução assinada pelo Presidente, é a seguinte: “os números bem torturados dizem o que nós queremos”.

O Relatório de Gestão do Município no ano de 2019 apresenta alterações em relação aos anos anteriores. Faremos a análise seguindo, sempre que possível, a estrutura do documento apresentado e evidenciaremos as suas contradições e os números que não são passíveis de mudar, mesmo após serem valentemente espremidos.

Partindo dos “objectivos estratégicos” definidos para o Município, os serviços apresentam o trabalho realizado. Neste aspecto o relatório não é uniforme e nota-se que os vários serviços não seguem a mesma matriz quanto à apresentação do seu trabalho. Uns são demasiado descritivos e outros muito generalistas. Serviços que elencam as suas funções, como a Divisão de Administração Urbanística e não acrescentam informação valorativa, outros como o Serviço de Intervenção Social e Parceria Solidária, indicam inclusive as datas das reuniões em que participaram, aspecto pouco relevante para a função deste Relatório. É pena que não se aproveite esta ocasião para fazer uma análise ao trabalho realizado e uma avaliação dos seus resultados. Apresentar resultados parcelares de auto-avaliação ou de inquéritos de opinião, não é significativo. Verificam-se também algumas omissões de aspectos importantes da vida municipal, que mais à frente referimos. Torna-se também evidente a necessidade de existir um trabalho de edição do Relatório.

Tendo em conta esta apreciação genérica que pensamos deveria dar origem a correcções nos próximos relatórios, deixamos aqui alguns dos aspectos que se nos afiguram como mais relevantes, sendo impossível analisar detalhadamente todo o relatório, quer pelo tempo que temos para o analisar, quer pelos recursos de que não dispomos.

Divisão de Administração Urbanística – Podemos repetir o que já dissemos o ano passado referente ao relatório de 2018: é apresentado o n.º de novos processos – 1.540, mas não temos informação de quantos foram findos neste ano. Se contarmos as licenças emitidas (314) e considerarmos como processos findos, o número é muito baixo e nem sequer sabemos em que ano entraram os processos agora findos. Repete-se a mesma situação. Sabemos que existem muitos processos, mas nunca conseguimos saber quantos estão em análise, quantos estão parados por responsabilidade dos munícipes e quantos de facto foram findos. Quanto ao tipo de processos o número de “diversos” continua excessivamente alto (686) e não é dada nenhuma ideia de que tipo de processos aqui cabem.

Realizaram-se 262 atendimentos no GURU – esta informação devia ser desenvolvida, tendo em conta que se trata da reabilitação urbana do centro histórico da cidade – uma prioridade do município. Repete-se a situação do relatório do ano anterior.

Continua a fazer-se referência à participação no Orçamento Participativo, no entanto sabemos que este está parado.

A informação dada não é quantificada, apenas enunciado o seu título. Por exemplo: “Coordenação da Comissão Municipal de Vistorias, realização de vistorias e elaboração de relatórios” - Não se deveria dizer, no mínimo, quantas vistorias foram realizadas no ano de 2019?

Revisão do PDM – não há nenhuma informação substancial. Refere-se o “acompanhamento do estado da arte”, mas o importante era dizer qual é esse estado.

Refere-se a proposta de suspensão parcial do PDM (Decathlon), mas não se refere a suspensão parcial para o Plano de Pormenor Cancela do Leão? Porquê? Foram ambas decididas no ano de 2019.

Sobre os processos RERAE – Regime Extraordinário de Regularização de Actividades Económicas, verificamos o seguinte:

Dos 31 processos entrados na Câmara (em 2 fases) têm decisão final 16, dos quais apenas 4 têm decisão favorável, sendo que 12 têm decisão favorável condicionada, o que significa que terão de executar alterações para se considerar legalizadas as actividades económicas.

Que avaliação se faz sobre este processo? Estão a ser cumpridas as condicionantes impostas? É bom lembrar que este processo começou em 2015… E os processos que tiveram decisão desfavorável, o que lhes aconteceu? Fecharam? De quem é a responsabilidade de fiscalização?

Trata-se de um regime extraordinário de regularização de actividades económicas, passaram 5 anos e não temos uma avaliação completa. Não dizemos que a responsabilidade é toda do Município, não é. Mas para exigir responsabilidade à administração central temos que realizar a nossa parte.

Muro de suporte do rio Almonda – continuamos sem saber qual o conteúdo da decisão judicial (embora o BE já tenha solicitado formalmente informação) de modo a justificar esta obra e o aumento do valor do seu custo.

Sobre as receitas da DAU, não podemos deixar de referir o valor das isenções, que descem em relação aos anos anteriores e sobretudo em relação ao ano de 2017 em que o valor atingiu os 96.147,97 (em 2019 ficou-se pelos 45.921,99). Não é alheio a estes números o facto de 2017 ter sido ano de eleições. Referimos este aspecto porque analisando as contas verificamos que existe um padrão quer ao nível das isenções, quer ao nível da execução da despesa que se concentra nos anos eleitorais. O Município necessita de uma gestão equilibrada durante os 4 anos de cada ciclo. Esta é a nossa visão sobre o modo de governação.

Por último diremos que já era tempo de existir uma informação mais detalhada e clara do Urbanismo, serviço cuja centralidade na actividade do município é inquestionável, e, não esquecer, é o sector em que recai maior número de queixas e desconfiança da parte dos/as munícipes.

StartUp – mais um caso de informação genérica. Ficamos a saber que 27 ideias foram avaliadas, mas não sabemos quantas ficaram na StartUp, quantas se autonomizaram, quais as áreas de negócio. A introdução assinada pelo Presidente adianta que 19 assinaram contratos de incubação. Consta do relatório a lista exaustiva dos workshops realizados, mas não consta informação sobre as áreas de negócio das ideias avaliadas e a situação das empresas, sendo que esta última é que importa.

Consolidar as Zonas Industriais existentes – com uma dotação inicial de 250.000,00, esta rubrica chega ao fim do ano com apenas 19.000,00 euros, dos quais só foram executados 14.600,00. Podemos agitar a obra no valor de 1.200.00,00+IVA, mas o que é um facto é que nunca mais se avança na 2.ª fase da Zona Industrial de Riachos que faz parte dos orçamentos há vários anos e com empréstimos aprovados para a sua concretização.

Quanto à Educação, estranhamos a ausência de referência à aprovação do Plano Estratégico Educativo Municipal (aprovado a 19 de Fevereiro 2019).

Nas contas apresentadas fica claro que em termos de custos com o pessoal não docente e com as refeições escolares, a despesa da Câmara é baixa (147.836,00 pessoal não docente e 141.793,00 alimentação), sendo por isso desejável que se aumente a despesa nestas áreas para apoiar as famílias.

Serviço de Intervenção Social e Parceria Solidária - é dada informação detalhada sobre as reuniões realizadas, mas não existe avaliação. Por exemplo, é referido que se realizaram “acções de sensibilização junto dos inquilinos em graves situações de carência económica com situações de irregularidades no pagamento de rendas mensais” – quantos casos? A “sensibilização” resultou em quê? Houve evolução?

Afirma-se que os processos são resolvidos de imediato e em parceria, mas não se diz quantos foram, já agora acompanhados de uma caracterização mínima.

Também se estranha a total ausência de referência à CPCJ tendo em consideração que a Câmara tem a presidência desta importante comissão.

No que respeita ao combate à Violência Doméstica não existe informação sobre o estado de desenvolvimento do Projecto MARIA (Estratégia integrada de intervenção para a área da violência doméstica e de género no Médio Tejo), nem sobre as Estruturas de Apoio e Atendimento. Há referência à nomeação de duas conselheiras para a igualdade (interna e externa) mas sobre o seu trabalho não há informação. Sabemos que no ano de 2019 não houve nenhuma iniciativa e nem sequer referência ao Dia Municipal para a Igualdade e ao Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres, o que é lamentável e foi evidenciado pelo BE na altura própria.

Reforço da Protecção Civil e Valorização Ambiental

Julgo que o primeiro parágrafo tem que ser alterado pois a sua redacção não é muito clara e pode suscitar equívocos, nomeadamente na questão da comparticipação em 50% da remuneração dos bombeiros – tem que se explicar a que se refere, assim como a referência à permanência de 5 funcionários municipais, referir que são bombeiros e que o município os dispensa no período DECIF.

Melhorar as Acessibilidades

No que à rubrica “Melhorar as Acessibilidades” diz respeito, um exemplo paradigmático e bem ilustrativo, vejamos o seguinte: no orçamento municipal, aprovado pela Câmara e Assembleia Municipal a dotação desta rubrica era 1.925.333,15 euros, com as várias alterações orçamentais da exclusiva responsabilidade do Presidente, a verba ficou reduzida a 823.000,00 euros e deste total apenas foram executados 282.000,00 ou seja 14% do inicialmente orçamentado. O que significa que tapámos uns buracos nas vias, pagámos 70 mil euros para as infraestruturas na envolvente do Hospital (uma obra destinada a um loteamento privado) e 40% do valor da reparação da fonte da Juventude. Neste caso, por muitas voltas que se dê, os números não enganam.

No que respeita ao Museu Municipal, Convento e Edições não é feita nenhuma referência à prestação de serviços da Galeria Neupergama.

Matérias a que o Relatório não faz referência:

Da leitura do Relatório ressalta a ausência de referência a algumas matérias relevantes durante o ano de 2019. É importante saber a razão pela qual o PS decidiu não referi-las.

Já referimos em cima o caso do Plano Estratégico Educativo Municipal.

Resitejo – criámos uma empresa intermunicipal mas continuamos a trabalhar com a associação de municípios? Podem coexistir as duas em simultâneo? A Câmara pode delegar competências nas duas entidades? Talvez devido a esta confusão se tenha optado por não falar do assunto…

Transferência de competências – A Câmara tomou decisões aceitando algumas competências a 8 de Janeiro. Esta decisão não tem reflexo no Relatório. Porquê?

Alienação de acções no TVT – esta decisão foi tomada em 2019 e não consta do Relatório.

Iniciativas como: Visita da Comissão Parlamentar de Ambiente; comemorações do 25 de Abril; apresentação do livro e disco de José Afonso na Gruta das Lapas; inauguração do campo de jogos “José Torres”; não mereceram referência no relatório.

Em 2019 foram iniciados processos para elaboração ou revisão dos seguinte Regulamentos, sem terem tido nenhuma sequência: Resíduos Sólidos (3 Setembro); Intervenção Social (6 Agosto); RMUE (6 Março).

O Orçamento Municipal de 2019 teve 28 alterações (da exclusiva responsabilidade do Presidente) e 3 revisões orçamentais – o ano em que se fez mais alterações e revisões.

No registo da situação dos contratos estão inscritos 330 contratos, dos quais apenas 13 são resultado de concurso público.

Poder-se-ia dizer que muitos contratos não necessitam de concurso público e é verdade, quer pelo seu objecto, quer pelo seu valor, mas apenas 13 em 330 dá que pensar. E fazendo uma leitura mais fina verificamos que apenas se realiza concurso público nos casos em que é obrigatório por lei, não utilizando este instrumento de contratação noutras situações, limitando assim a transparência do procedimento e em muitos casos repetindo a contratação com as mesmas entidades, pois os casos em que existe consulta a várias entidades é também bastante reduzido. Relembro que o relatório da IGF da acção de controlo sobre contratação pública de 2018 fazia referência ao elevado número de ajustes directos praticados pelo Município. Eu bem sei que está tudo dentro da legalidade, mas não significa que seja uma boa prática. Para o BE não é uma boa prática.

Verifica-se também que existe uma grande dependência de alguns sectores da Câmara de serviços prestados por entidades exteriores, como por exemplo a Protecção Civil, que depende de duas empresas com prestação de serviços na área da silvicultura e outra de projectos florestais, para não falar da contratação externa para elaboração do Plano Municipal de Emergência.

Os Indicadores de Gestão Orçamental são elucidativos e chamo a atenção para dois:

Serviço da dívida / Receitas Totais – Avalia o peso do serviço da dívida (amortização+juros) nas receitas totais – 10,54% - indicador que tem vindo a baixar o que é positivo e encontrar-se num patamar aceitável.

Investimentos / Despesa Total – Mede o peso das despesas de investimento no total das despesas pagas – 9,89%, mantendo mais ou menos o nível dos dois anos anteriores. É este indicador que nos permite avaliar o nível de investimento do Município e verificamos que é muito baixo. Ou seja, cumpre-se o normal funcionamento, mas não se faz obra. Este era um orçamento que permitia avançar e o PS perdeu essa oportunidade.

A este propósito vejamos o ponto 20 do Relatório da Auditora sobre a execução orçamental da despesa: “A rubrica que apresenta menor taxa de execução é a Aquisição de Bens de Capital que dos 6.468.345 euros previstos para 2019 foram executados 2.332.381 euros (36,06% de taxa de execução, sendo que 77,40% da despesa já estava compromissada).” Comprovando que o nível de investimento é muito baixo e completando a informação que o Presidente não dá na Introdução, ou seja refere o total do valor “compromissado”, mas omite o valor executado.

Por último aproveitamos para cumprimentar os e as trabalhadores e trabalhadoras do Município e o seu esforço no cumprimento do serviço público.

O BE não acompanha a narrativa que sustenta este Relatório. As contas podem estar certas, mas a narrativa sobre o que se fez não corresponde à nossa avaliação. O nosso voto é contra.

Torres Novas, 15 de Maio 2020

Helena Pinto, vereadora Bloco de Esquerda